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Empresas & Negócios

- Publicada em 29 de Janeiro de 2018 às 00:34

Da classe C ao marketing dirigido

André Torretta. Divulgação Ponte Estratégia

André Torretta. Divulgação Ponte Estratégia


/PONTE ESTRATÉGIA/DIVULGAÇÃO/JC
Marcelo Beledeli
No ano passado, o mercado publicitário brasileiro foi surpreendido com a notícia da chegada ao País da Cambridge Analytica, empresa britânica de Big Data que gerou polêmica pela sua atuação na campanha do candidato republicano Donald Trump, nos EUA. A companhia é proprietária de um software capaz de mapear informações comportamentais e psicológicas dos consumidores, e fornecer a eles propaganda extremamente dirigida.
No ano passado, o mercado publicitário brasileiro foi surpreendido com a notícia da chegada ao País da Cambridge Analytica, empresa britânica de Big Data que gerou polêmica pela sua atuação na campanha do candidato republicano Donald Trump, nos EUA. A companhia é proprietária de um software capaz de mapear informações comportamentais e psicológicas dos consumidores, e fornecer a eles propaganda extremamente dirigida.
A entrada da Cambridge no Brasil ocorreu graças a uma parceria com André Torretta, publicitário baiano especialista em marketing político e fundador da consultoria A Ponte Estratégia, que foi pioneira em pesquisas voltadas para a classe C. Agora, à frente da Cambridge Analytica Ponte - resultado da parceria com a empresa britânica - Torretta quer unir sua expertise na classe média com as ferramentas de Big Data e marketing direcionado.
JC Empresas & Negócios - Sua carreira começou no marketing político. Como foi a passagem para a iniciativa privada?
André Torretta - No começo dos anos 2000, a classe C estava começando a nascer no País, e as empresas achavam que, se eu tinha experiência na esfera pública - o que demanda entender o povo -, poderia transferir esse conhecimento para a iniciativa privada. Daí, montei a Popular Comunicação e o Data Popular, que era o instituto de pesquisas. Mas o ponto de mudança veio com uma experiência em 2005. A Organização Mundial da Saúde me pediu para testar um novo modelo de pesquisa, isso porque 70% dos brasileiros têm algum nível de analfabetismo funcional. Será que eles respondem um questionário do jeito que uma pessoa que mora no bairro Moinhos de Vento responde? Será que a compreensão das palavras é a mesma? Então a gente capacitava pessoas da periferia para que fossem nossos pesquisadores, e eles nos ajudavam a refazer o questionário, utilizando palavras que eram entendidas por essas populações periféricas. Com isso, aprendi a vida como ela é aqui no Brasil, não a vida do Power Point dos escritórios. Inspirado nisso, em 2008, montei A Ponte Estratégia, como consultoria especializada nesse mercado emergente, e a gente "surfa", então, com o boom da classe C no Brasil.
Empresas & Negócios - Como surgiu a parceria com a Cambridge Analytica?
Torretta - Em 2016, fui procurado pela empresa. Eles queriam entrar no Brasil para fazer marketing político. Durante a conversa, fiquei muito interessado pelo tema do mundo digital. Para a classe C brasileira, o mundo só começou a existir em 2014. Antes, não tinha smartphone, não tinha penetração, não era barato. Chegamos a ter um início com movimentos como o Orkut, em lan houses, mas o grosso da classe C brasileira pulou o desktop e passou a conviver com a internet no mobile.
Empresas & Negócios - A crise reduziu a importância da classe C?
Torretta - Obviamente, houve uma diminuição do poder de consumo da classe média brasileira, mas ela ainda é um contingente enorme de pessoas, que precisa de um modelo de negócios diferenciado. Você pode chegar no Moinhos de Vento e vender uma cerveja a R$ 15,00, mas, na periferia, tem que vender por R$ 6,00. Só que vende para 160 milhões de pessoas, então ganha em quantidade. O problema é que as empresas não pensam que vivemos em um país pobre.
Empresas & Negócios - Elas pensam que vivemos onde?
Torretta - Você tem todos os departamentos de marketing, de comunicação, muito focados para um mercado como se fosse o de Nova Iorque, mas o que dá certo lá não dá certo no Amapá. Nos anos 1990 e no início do século XXI, estávamos vivendo em plena força a globalização, e muitos pensavam que era possível vender a Pizza Hut de Nova Iorque na Nigéria. Só que, 20 anos depois, não venderam esse produto lá. Hoje, na Nigéria, a Pizza Hut que mais vende é uma com um tipo de risotto local, e uma outra com bananas. Então, é preciso uma estratégia global, mas com táticas locais. Não quero ser do mundo, quero, primeiro, ser rei da minha terra.
Empresas & Negócios - O brasileiro médio se vê refletido na publicidade atual?
Torretta - Marketing tem que ser voltado para a população consumidora. Há 20 anos, quem consumia eram apenas os "bacanas", a elite. Hoje, a publicidade já é mais diversa, mas isso porque o Brasil passou por um movimento econômico que gerou mudanças na propaganda devido às mudanças na sociedade. Por exemplo, você vê uma presença feminina bem maior na propaganda do que havia há 10 anos. Mas, nesse tempo, a renda das mulheres cresceu bem mais do que a dos homens. A renda do negro cresceu mais do que a do branco. Achar que isso não vai dar em nada é uma cegueira.
Empresas & Negócios - Qual é a grande mudança no consumo?
Torretta - O principal é que não tem mais mainstream, não tem mais apenas Antárctica, Brahma e Skol. Temos "1 milhão" de cervejas hoje. Aliás, vai ter "1 milhão" de tudo. As marcas vão sofrer muito, e já estão sofrendo. O brasileiro não quer mais marca, quer qualidade, quer algo que realmente o agrade. Não há mais uma moda reinante, há 10 modas reinantes. Ninguém mais quer ser igual a todo mundo. E as marcas vão enlouquecer, porque como você faz a venda em quantidade se você não é mais mainstream?
Empresas & Negócios - Como as novas tecnologias vão mudar o marketing político?
Torretta - Você tem um processo que começa em 2007, que é a possibilidade de mídia endereçada. Se você pode mandar um conteúdo com linguagem diferente para cada região, ou mesmo para cada pessoa, por que não faz? Muita gente chama isso de manipulação de informação. Para mim, é algo normal. Se vou falar com você, vou falar sobre aquilo que você quer conversar. Por que tenho que impor minha conversa? Antigamente, você impunha uma conversa à população toda, mas somos um país continental, com 200 milhões de habitantes. A política é obrigada a ter a mesma conversa com todo mundo?
Empresas & Negócios - Esse método de marketing pode reforçar as "bolhas de informação" das redes sociais?
Torretta - Isso não é um problema do marketing político, mas uma crítica às redes sociais que criaram essa situação. A gente atua com a ferramenta que existe. A televisão nos obrigava a ter uma conversa nacional. Ninguém nunca questionou isso. Nós, do marketing político, jogamos conforme a regra do jogo, mas não a fazemos. Não fizemos as redes sociais, assim como não fizemos a televisão. Se você não gosta da regra, não discuta comigo, discuta com o Congresso Nacional. Mas, se você tem uma ferramenta em cima da mesa, não dá pra esperar que não use.
Empresas & Negócios - O uso do Big Data e das novas tecnologias deve encarecer ou baratear as campanhas?
Torretta - Digamos que estou trabalhando para um candidato de esquerda. Vou gastar dinheiro tentando conversar com o cara que vota na extrema direita? Não, vou conversar com quem pode ter algum apreço por mim. Em última instância, isso significa um barateamento de campanha, porque, antes, era obrigado a falar com todo mundo, inclusive com os que me odeiam.
Empresas & Negócios - As empresas privadas também poderão usar o marketing direcionado?
Torretta - A Cambridge já está fazendo isso, e estou oferecendo esse serviço para meus clientes. Meu objetivo é saber como faço para vender um produto para cada cidade, cada bairro ou mesmo cada pessoa, pois cada um tem um gosto diferente.
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